Paris sera toujours Paris

…La plus belle ville du monde.

Um dia depois das eleições, dormi em um trem e acordei em Paris. É a cidade mais linda do mundo. Andei por suas ruas – francesas demais, como tudo parece ser na França; seus prédios planejados alinhados em tons de bege e amarelo claro, como se projetados para ornar com aquele momento preciso, aquele segundo no tempo em que uma certa cor-de-outono se espalha e colore a paisagem em folhas que caem.

Queria eternizar suas cores. Escrevi mesmo sobre elas. Mas na bagagem sobrecarregada que pesava nos ombros, entre mais peças de roupas do que viria a usar, cosméticos demais, dias de menos, escolhi embalar um rolo de filme já meio gasto em preto e branco. Conceitual. E poético. Como Paris.

Não sou expert em fotografia. Talvez devesse ter começado com este disclaimer. Não entendo nada sobre configurações, exceto o que li no manual da câmera semiautomática que um dia foi do meu pai. Ou como virar para a esquerda e para a direita para ajustar o foco, aproximar e afastar a objetiva. Também não li os guias otimizados para mecanismos de busca que ensinavam o básico sobre como fotografar em preto e branco. E, embora tivesse prometido para mim mesma que seria engajada nas composições, não abri uma única vez o medidor de luz instalado no meu celular na noite anterior.

Mas mesmo com todas as negativas, Paris é um golpe de sorte. É tudo à toda hora o tempo todo. Tempo, espaço, memória. Uma imensidão urbana que te leva a transbordar.

Com a cor fora de cena, a cidade-luz tornou-se luz e sombra – ou, na pior das hipóteses, flash. Sua magnitude toda entra em foco: no letreiro brilhante que ganha ares néon no plano monocromático. No pedaço do Sena, capturado do recorte de uma janela de museu. No Sena, ele todo, enquadrado em suas bordas por um monte de folhas. Uma cidade toda baixa, feita de prédios com muitas janelas que nunca chegarão a ser arranha-céu. No Louvre, vazio em um dia de feriado. Na multidão que ocupa a fachada do Orsay, em contrapartida, protagonizando a cena com suas expressões, rostos e corpos em semi-movimento. No homem que divide o espaço da fotografia com a brasserie dos dois museus. Sua veste elegante contra os prédios da esquina. Seu rosto, esquecido no tempo. Tenho certeza de que era belo. Ele talvez peça um café. Para viagem. Nos registros borrados, capturados depois do terceiro pot de vin à partager.

Adicionei à bagagem, já excessiva, dois ilford hp5 preenchidos com a surpresa do inesperado. A maravilha da incerteza das capturas do rolo, fotografado às cegas. Talvez prejudicados pela máquina de raio X na entrada do museu. Ou pelo estranho que atravessou a foto no momento em que o seu dedo apertou o interruptor. Ou talvez essa venha a se tornar a tomada mais interessante do dia. Um efeito fantasmagórico contracenando com um Munch caro demais. Muitos cliques intuitivos que nunca seguiram a máxima pensarduasvezesantesdeapertarobotão. Afinal, em cada clique se gasta dinheiro. E erros custam caro.

Mas nesse jogo de tentativa e erro, nada importa muito.

Car après tout, Paris sera toujours Paris. La plus belle ville du monde.

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